Nem ela,
nem ele eram bonitos. E sabiam disso. Só não se contentavam com tal condição
porque isso, realmente, nunca os incomodou. Na verdade, curtiam toda essa
contravenção à beleza.
Também
não eram os mais inteligentes. Mas sim, antenados. Mantinham certo movimento
sociocultural. Assistiam a bons filmes, conheciam bons autores, falavam de
música, teatro e até novela com certo desprendimento. Não eram de muitos
preconceitos.
Deixavam
de conhecer pouca coisa um do outro, se sabiam quase que por inteiro. Ainda
assim, sempre havia de existir algo de interessante e novo a ser descoberto.
Quando se
encontravam, os olhos pediam-se em namoro. A boca sussurrava o sim que dançava
até a altura dos ouvidos. A desobediência aos padrões era a principal
testemunha desse amor.
Ela
deixava de ser a mulher perfeita, apesar da vontade dele. Ele deixava de ser o
homem ideal, apesar da esperança dela.
Costumavam
pregar pequenas mentiras a tantos. Mas não conseguiam mentir um ao outro.
Ela não
era de Leão, Câncer nem de Áries. Ele não era de Touro, Peixes ou Sagitário. Desalinhados, eram o inferno-astral um do outro, e isso fazia da relação o verdadeiro
paraíso. Ela não vestia 38. E ele começava a dar sinais da futura perda de
cabelos.
Ela não
era o que ele costumava a considerar bonito, até conhecê-la. Ela também não via atrativos em tipos como ele, antes de encontrá-lo. A falta de perfeição os
perdoava.
Ao contar
piadas ele nunca acertava na comédia. Quando ela ria não era nada delicada. Ele
não tinha frases prontas, desenvoltura para conversas a dois, nem paciência
para almoços em família.
Ela não
era lá muito romântica, controlada e aventureira. Errava nas receitas e adorava
uma dose a mais. Era mais salgada do que doce. Mais Madonna que Maria Rita.
Mais noite do que dia.
Ele não
era bom ouvinte, nem dava os melhores conselhos. Era melhor gourmet que
dançarino. Não vestia as roupas mais bacanas. Arranhava no violão e mandava mal
no inglês. Não era bom em datas. Ele era mais rock do que bossa nova. Mais
chopp do que academia.
Ele não
tinha a mínima intenção de ser o melhor. E ela não saberia viver se não fosse
aos tropeços.
Se amavam do avesso, que para eles era o lado certo. Se amavam tudo que podiam e até mesmo pelo que não
eram.
Se amavam e não buscavam a perfeição: isso sim que é o mais importante, aceitar que o outro não é o deus grego, não é a pessoa que resolverá nossos problemas. O ser amado é alguém que nos acolhe para ser acolhido. Alguém com quem possamos compartilhar momentos e respeitar as diferenças. Nada mais que isso.
ResponderExcluirAbraços.
Tão bom que as coisas possam acontecer desta maneira, sim? A aceitação tem um poder incrível. O respeito pelo outro e pelo que ele é. Como bem disse, "acolher para ser acolhido". É exatamente isso! Grande abraço. Obrigada, mais uma vez, pelo comentário!
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